domingo, outubro 29, 2006

El Pais: Babelia: Herberto Helder

Na edição de ontem, sábado, o suplemento Babelia fala de um Poeta Obscuro:
Bloco de textoIntroductor del surrealismo en su país en los años cincuenta, próximo a algunos de los postulados de la poesía experimental más tarde, Herberto Helder participa en varios de los proyectos más importantes de la historia reciente de la literatura lusa, como Folhas de Poesia o Poesia Experimental. Desde el meridiano del siglo, ha construido una obra intensa y singular, sin debilidades ni concesiones, pareja en muchos aspectos a su propia experiencia personal, con décadas de vida recluida y de entrega total a la escritura y el lenguaje, rechazando participar en antologías, entrevistas o encuentros y recibir premios, como los prestigiosos Europalia o el Fernando Pessoa, que le habían sido concedidos.
De esta forma, Herberto Helder ha ido consolidando una obra profundamente personal, enigmática y depurada, que nunca deja indiferente a sus lectores, y que hace de los dominios del lenguaje su campo exacto de movimiento.

sábado, outubro 28, 2006

e.e.cummings: um poema de amor

i carry your heart with me

i carry your heart with me(i carry it in
my heart)i am never without it(anywhere
i go you go,my dear; and whatever is done
by only me is your doing,my darling)
i fear
no fate(for you are my fate,my sweet)i want
no world(for beautiful you are my world,my true)
and it's you are whatever a moon has always meant
and whatever a sun will always sing is you

here is the deepest secret nobody knows
(here is the root of the root and the bud of the bud
and the sky of the sky of a tree called life;which grows
higher than the soul can hope or mind can hide)
and this is the wonder that's keeping the stars apart

i carry your heart(i carry it in my heart)

(e.e.cummings)


carrego o teu coração comigo

carrego o teu coração comigo(carrego-o em
meu coração)nunca estou sem ele(onde
eu vou tu vais, querida; e o que é feito
só por mim és tu que fazes, meu amor)
eu não temo
nenhum destino(tu és o meu destino, meu doce)eu não quero
outro mundo (pela tua beleza ser o meu mundo, minha verdade)
e tu és seja o que for que a lua signifique
e o que quer que o sol cante sempre és tu

aqui está o segredo mais profundo que ninguém sabe
(a raíz da raíz e o botão do botão
e o céu do céu da árvore chamada vida; a qual cresce
mais alto do que a alma espera ou a mente esconde)
e este é o milagre que mantém as estrelas separadas

carrego o teu coração( carrego-o em meu coração)

(Tradução de J.T.Parreira)

sexta-feira, outubro 27, 2006

Leopardi: Canti

O patria mia, vedo le mura e gli archi
e le colonne e i simulacri e l'erme
torri degli avi nostri,
ma la gloria non vedo,
non vedo il lauro e il ferro ond'eran carchi
i nostri padri antichi. Or fatta inerme,
nuda la fronte e nudo il petto mostri.

quinta-feira, outubro 26, 2006

America

Quando potrò andare al mercato
con il cuore in mano
Con il mio fascino
pagherò vino e latte
Userò le dita
come codice
alla sbarra
che dirà la verità.

(Traduzione di Alessandra S.Banti)

quarta-feira, outubro 25, 2006

Haikus de Kobayashi Issa (1763-1827)

鶏の抱かれて見たるぼたん哉
niwatori no dakarete mitaru botan kana

sitting on her eggs
the chicken admires
the peony

sentada em seus ovos
a galinha admira
a peónia


Snow melts,
and the village is overflowing –
with children.

Derretimento da neve,
e a aldeia está a transbordar-
com crianças.

(Tradução:J.T.Parreira)

terça-feira, outubro 24, 2006

O guarda do farol

A luz que mora no farol
toca com nostálgicos
dedos os navios,

iluminados
por dentro
são as janelas da noite,

depois afastam-se
com um princípio,
meio e fim, depois

nem o rasto branco
fica na ondulada folha,
azul-escura, das águas.

A luz que mora no farol
conhece de cor
o faroleiro, ele manuseia

as trevas, os ventos, o rugir
do mar, ele diz
por onde a luz deve ir,

tem sempre uma última
luz na beira das manhãs.

sábado, outubro 21, 2006

Apollinaire (Sob a ponte Mirabeau)

Óleo do poeta Ferreira Gular

Sob a ponte Mirabeau desliza o Sena
E os nossos amores
É bom lembrar, vale a pena,
Que a alegria sucede aos dissabores

A noite vem passo a passo
Os dias se vão eu não passo

As mãos nas mãos estamos face a face
Enquanto passa
Sob a ponte de nossos braços
A onda lenta de um eterno cansaço

A noite vem passo a passo
Os dias se vão eu não passo

O amor se vai como esta água barrenta
O amor se vai
Como a vida é lenta
E como a esperança é violenta

A noite vem passo a passo
Os dias se vão eu não passo

Passam-se os dias passam-se as semanas
Nada do que passou
volta de novo à cena
Sob a ponte Mirabeau desliza o Sena

A noite vem passo a passo
Os dias se vão eu não passo

(Tradução por Ferreira Gullar)

Memórias aos 59

When I look back, I see a collapsing
accordion of my receding houses
Robert Lowell

Quando olho para trás, vejo o colapso
da minha infância, a derrocada
dos meus calções de golfe
e camisas aos quadrados,
ao mesmo tempo que o das casas
e dos quartos e das janelas
em que debrucei os meus
primeiros, inocentes olhos
e assim a sucessão
das ruas em lisboa
quando olho para trás
vejo meus pais
a quererem talvez mover-se
para o futuro.

quarta-feira, outubro 18, 2006

1961

O meu coração sem trânsito
num tempo
de amores platónicos
no ano 1961.
Os olhos fugiam
para a janela aberta da casa
ali ao lado
o branco e o preto
era a hora do mundo
no televisor.
Nem ouvia os ruídos da rua
começava a ter
Angola
as obscuras mortes
e a juventude pendurava
o seu sorriso
na sala oval da América.
Nem via os rostos a passar
dos velhos vizinhos
- que diziam
sinhe!, Cindinha ,
que esgotaram
já o prazo concedido
às linhas da memória.
Hoje é a mesma rua uma água
turva e larga, por onde se vai
para casas vazias.

17-10-2006

domingo, outubro 15, 2006

Breve súplica por MM

Senhor
recebe esta rapariga celebrizada em toda a Terra com o nome
de Marilyn Monroe,
ainda que esse não seja o seu nome verdadeiro
(mas Tu conheces o seu nome de batismo, o da órfã violada aos 9
anos
e da empregada de balcão que aos 16 já queria suicidar-se)
e que agora se apresenta diante de Ti sem maquilhagem
sem Assessor de Imprensa
nem fotógrafos, nem sessão de autógrafos
sozinha como um astronauta dentro da noite espacial.

(Tradução de J.T.Parreira)

sexta-feira, outubro 13, 2006

Revista Famigerado, nº 7

Literatura & Adjacências, com traduções, poesia e artigos

¡ tradução ¡
Bukowski e Ungaretti por J. T. Parreira
Eugène Ionesco por Geraldo Lima
Guy de Maupassant por Amilcar Bettega
Jüri Talvet por Daniel Glaydson
Walt Whitman por Luis Benítez

& etc.


Fiat Lux

Era uma vez o escuro,

e fez-se a luz,
a tênue luz de um candeeiro,

então questionei:
– Mal se divulga um vulto?

O candeeiro flamejou:
– Para quem está no breu
qualquer lampejo é alumbramento.

(José Inácio Vieira de Melo)

quinta-feira, outubro 12, 2006

Nobel da Literatura: o romancista Orhan Pamuk


The Nobel Prize in Literature 2006- Orhan Pamuk

"who in the quest for the melancholic soul of his native city has discovered new symbols for the clash and interlacing of cultures"

A sua obra nutre-se da excepcionalidade e ancestralidade de Istambul, e do carácter de ligação entre culturas dessa cidade.
Em Portugal, duas traduções: A Cidadela Branca, de 2000, e Jardins da Memória. Em Espanha saiu agora El Estambul.


quarta-feira, outubro 11, 2006

Regresso a casa depois da tarde

Sem projectos
nem sensibilidade
na ponta dos dedos

dos olhos
já caiu o pano
sobre os sonhos

perdidos
como um transporte
público

como um trem
que ao longe acende
o nevoeiro
com a derradeira luz
vermelha

nada há
a fazer, abres
a porta e a casa
ouve-te
em silêncio.

sábado, outubro 07, 2006

A Despedida

Entre as mãos e a parede
a cabeça dela segura
e agarra o mundo
depois, um a um
desata os dedos
dos cabelos
a corda presa ao cais.

O Mito de Sísifo e o Nobel da Literatura


Escrevi isto, há exactamente um ano atrás, e o enredo repete-se:
Desde 1901 que o Prémio Nobel da Literatura é, para os candidatos, a materialização do Mito de Sísifo, excepto, claro está, para o vencedor.Este ano, no que à Poesia diz respeito, há dois candidatos perfilados: um poeta sueco, psicólogo de formação, Tomas Transtromer, que desde 1950 tem vindo a influenciar a literatura do seu país; e um sírio, sério candidato ao Prémio, Ali Ahmad Said, que assina com pseudónimo Adonis.
Mas o candidato melhor perfilado, segundo os Bookmakers, está na área do romance: o turco Orhan Pamuk, considerado o favorito para o Nobel de 2006. Em todo o caso, os autores americanos, a Joyce Carol Oates e o Philip Roth continuam na lista, este ano. Aguardemos, porque a verdade da Academia é sempre a surpresa.
Bom fim de semana!

sexta-feira, outubro 06, 2006

Um Haiku de Jack Kerouac



Haiku(Birds singing...)

Birds singing
in the dark
-Rainy dawn.

(Jack Kerouac)

Pássaros que cantam
na escuridão
-Amanhecer chuvoso.


Haiku(Árvore a descansar...)

Árvore a descansar
no tapete do chão:
deitada na sombra.

(J.T.Parreira)

quarta-feira, outubro 04, 2006

Despedida

Novos amigos, não quero.
Nem primos, nem descendentes.
Amizade requer provas
na longa extensão dos dias.
Quanto aos netos de meus netos,
sequer ouvirão de mim.

Quero empedrar-me onde estou,
enraizar-me aqui mesmo.
Como alcançarei o cerne
de outras terras, de outras gentes,
se um relógio fatigado
em minhas córneas põe fim?

Novos compêndios, pra quê?
Alfarrábios, muito menos.
Virgens metáforas se perdem,
no crepúsculo definham.
Amigos, filhos, cenários,
adeus, para nunca mais.

(Joanyr de Oliveira)

terça-feira, outubro 03, 2006

Relato

Aqui está um homem
que não aguentava mais.

Os muros com a sua cal branca
hipócrita, não mais que o simples
meio de fechar o horizonte

aqui está um homem com um rosto
entardecido, sulcado
pela erosão das lágrimas

um homem
que não aguentava mais
esperar
que se retirava do mundo
para trás de um jornal
preso em demasia
por todas as emoções estrangeiras
pelo preço do petróleo
perfurando as alturas
não aguentava mais

aqui está um homem
suspirando pela sua infância
e que quis surpreender-se
com a morte.

3-10-2006

Passageiro de Museu

Sumário:
-A Rapariga que lê, de Renoir




















Folha a folha os olhos saltam
para dentro do mundo inesperado.